segunda-feira, 8 de junho de 2015

A arte de recusar um original - Camilien Roy



Título: A arte de recusar um original
Título original: L'art de refuser un roman
Autor: Camilien Roy
Tradutor: Pedro Afonso Vasquez
Editora: Rocco
Formato: 12,5 x 20 cm
Nº de páginas: 144
Ano de publicação: 2009


***

Se você trabalha numa editora, já precisou escrever uma carta de recusa para algum autor que enviou um original não solicitado? Se você é escritor/futuro autor, já recebeu uma carta de recusa de alguma editora?

Nunca fui responsável por selecionar originais de autores nacionais e enviar cartas de recusa. No entanto, imagino que não seja tão difícil fazer uma primeira análise de um original, verificar se ele se encaixa na linha editorial, se tem uma qualidade mínima para ser publicado, se tem potencial de vendas (auxiliado ou não por investimento em marketing), se a editora teria verba para publicar aquela obra naquele momento, se aquele momento é ideal para publicar/ investir em uma obra como aquela, se outras editoras já não publicaram títulos semelhantes etc. Dependendo da avaliação final, depois basta enviar uma carta de recusa padrão ao autor ou, caso se decida publicar, entrar em contato com ele para acertar detalhes de publicação e assinatura do contrato.

Mas, voltando ao livro, ele contém quase 100 (contei 98) cartas de recusa escritas em vários estilos: clássico, agressivo, honesto, direto, desdenhoso, redundante, entre vários outros. Às vezes é engraçado e algumas cartas parecem expressar a personalidade de editores de carne e osso e o que gostariam de escrever para determinados autores.

Seguem alguns trechos de cartas contidos no livro:





Mesmo o livro tendo um formato pequeno e sendo relativamente curto, demorei um pouco para terminar a leitura, pois, em certo ponto, começa a ficar cansativo. É basicamente a mesma coisa escrita de formas diferentes. Apesar disso, é um livro curioso.

Lendo alguns trechos das cartas, lembrei da Stephenie Meyer, autora da série de livros Crepúsculo, pois há vários anos entrei no site dela e, apesar de não simpatizar com os livros dela - e de não ter lido nenhum deles -, era bastante interessante a forma como (ela diz que) tudo aconteceu: ela sonhou com os protagonistas e escreveu alucinadamente a história com os personagens do sonho enquanto os filhos estavam na escola; depois enviou o original a várias editoras e contou que recebeu cartas debochadas e mesquinhas de alguns editores. Pesquisei e parece que isso é (ou pelo menos era) bastante comum: alguns editores, supostamente os donos da verdade, falam ou mandam cartas dizendo, em outras palavras, que os autores escrevem muito mal. Fiquei pasma porque isso aconteceu até com o Cristóvão Tezza (autor do ótimo romance O filho eterno) - leiam esta matéria.


Depois de ler este livro e de saber que alguns editores são tão arrogantes, cheguei a algumas conclusões (talvez muito óbvias, ou não):

1. Muitas pessoas aspirantes a editores apreciam "alta literatura"; gostam de ler livros que tenham algo de significativo etc. No entanto, existem poucas editoras que publicam esse tipo de livro, até porque há relativamente poucas pessoas interessadas em comprar esse tipo de produto (lembrando que o livro é um produto, ainda que não pareça), logo, a probabilidade de futuros editores trabalharem em editoras que publicam livros de autoajuda, técnicos, didádicos, entre outros gêneros mais "acessíveis" é bem maior do que trabalhar em uma editora que publique literatura.

2. Supondo que houve oportunidade ou sorte ou oportunidade e sorte, além de esforço pessoal, e a pessoa conseguiu um emprego de editor em uma editora que publica livros de ficção (romances e contos) de autores nacionais. E que, entre outras atividades, esse editor precisará selecionar originais de futuros autores para publicação *frio na barriga*. Como lidar com centenas de originais não solicitados e de baixa qualidade? [Eu mandaria uma carta de recusa padrão para a maioria dos originais não selecionados e pronto.]

3. Por que alguns editores são tão arrogantes a ponto de fazer os autores se sentirem um lixo? Ainda mais se pensarmos que muitos editores não são necessariamente escritores/autores. Para mim, não faz sentido gastar energia com isso. [Manda uma carta de recusa padrão e pronto!] Para mim, um bom editor é também um "antecipador de tendências". Pode até ser que o livro não seja "bom" [de acordo com o que cada um julga "bom" ou "literário" ou "alta literatura"], mas pode ser um ótimo best-seller, ou seja, um livro com um alto potencial de vendas. Se o livro vender muito, ganha o autor, ganha a editora e talvez o editor, que talvez tenha aval do diretor geral para investir uma parte do lucro desse best-seller em outras obras menos vendáveis mas importantes para outros tipos de leitores e para manter o catálogo com títulos de qualidade. Para mim, hoje em dia, não faz sentido a editora ter um catálogo "invejável", com livros excelentes (conteúdo e arte gráfica) se os livros ficam todos encalhados no estoque.

4. Conclusão final: editores precisam ser, além de intelectuais (talvez), sensatos e bons administradores. É preciso se despir de toda a "intelectualidade" e arrogância, para dar lugar ao administrador, além de ter bom senso o suficiente para entender que se a editora não tiver livros que vendam (independentemente da qualidade literária) em seu catálogo, uma hora a editora pode quebrar. Num futuro próximo, imagino que os editores precisarão ter esse tipo de visão macro e meio cínica. Até porque não seria sensato massacrar autores altamente rentáveis como a Stephenie Meyer.

Vamos conferir se o que estou escrevendo faz sentido (ou não). Daqui uns anos, daqui a vários anos.

***

Links sobre esse assunto (recusa de originais por editoras) que li e achei interessantes:

Editores esnobam Machado de Assis - Esdras do Nascimento, Observatório da Imprensa
Meu original foi recusado, por quê? - Laura Bacellar, Escreva seu livro
O romancista que não sou - Luiz Schwarcz, Blog da Companhia


Nenhum comentário:

Postar um comentário