segunda-feira, 15 de junho de 2015

Otávio Júnior, o livreiro do Alemão


Título: O livreiro do Alemão
Autor: Otávio Júnior
Editora: Panda Books
Formato: 14 x 21 cm
Nº de páginas: 80
Ano de publicação: 2011


***

Encontrei este livro meio que por acaso, vasculhando promoções em algum site há algum tempo e foi uma grata surpresa.

Gosto de biografias e autobiografias, pois, em geral, elas me inspiram. Fico admirada quando descubro como algumas pessoas conseguem traçar planos e sonhos e correr atrás deles. De certa forma, sucesso para mim é isso: concretizar planos e sonhos. Ter determinação e força de vontade para transformar ideias em algo concreto. Muita gente se perde no caminho e acaba não concretizando nada. Por isso gosto de ler histórias de pessoas que queriam muito algo e como chegaram lá.

Foto tirada daqui


Quando tinha 8 anos, Otávio encontrou uma caixa de brinquedos perto de um campo de futebol que costumava frequentar. Como ele deu um grito de espanto, os outros meninos que estavam jogando futebol logo vieram ver o que ele havia encontrado e ele acabou ficando só com um livro chamado Don Gatón. Naquela noite choveu forte e a luz acabou, então Otávio se lembrou do livro e foi ler à luz de velas.

Assim começa a história de Otávio, que acabou se tornando um leitor ávido: frequentava bibliotecas e pedia livros para os moradores da comunidade. E os livros que lia acabaram inspirando-o a criar uma "barracoteca" na comunidade onde vive, o Morro do Caracol, vizinho ao Complexo do Alemão, no Rio de Janeiro, com o intuito de despertar nas crianças a vontade e a curiosidade pela leitura e pelos livros.

Otávio também treinava futebol e fazia aulas de teatro quando era adolescente. A certa altura, a mãe passou a manter a casa sozinha, pois o pai havia se tornado alcoólatra; nessa época, ele talvez tenha sentido obrigação de ajudar a mãe e começou a fazer dinheiro a partir do teatro (encenava peças em escolas).O treinador de futebol pediu para que ele escolhesse entre o futebol e o teatro, pois ele não estava mais rendendo em campo como antes. Ele ficou com o teatro. 

Depois escreveu um livro infantil, enviou para as editoras, mas nenhuma se interessou. Com a ajuda da lista telefônica, procurou uma gráfica, mas quando chegou lá, a dona havia falecido há alguns anos, mas (sorte? destino?) o filho da dona, que devia cuidar da gráfica na época, ficou com o original e pediu para ele voltar lá depois de uma semana. Otávio voltou, o dono da gráfica disse que ele (Otávio) precisava encontrar alguém que revisasse o livro e também um ilustrador - o dono da gráfica então imprimiria os livros de graça, seria um presente.

Vários meses depois, o livro ficou pronto, Otávio participou de feiras do livro dentro e fora do país. Vendeu seus livros. Na verdade, não foi tão fácil quanto estou contando. Na Flip, por exemplo, ele foi praticamente só com o dinheiro da passagem de ida, sem ter dinheiro para pagar lugar para ficar nem passagem de volta, vendeu livros e, assim, conseguiu pagar um albergue, comida e arranjou carona para voltar para o Rio. Como sobrou um dinheiro da venda dos livros na Flip, em 2003 ele veio para a 1ª Feira do Livro Infantojuvenil, em São Paulo.

É uma história de superação incrível. Mas ainda tem mais.

Otávio chegou a participar do programa Caldeirão do Huck, no quadro "Agora ou nunca", para tentar ganhar R$ 10 mil e, entre outras coisas, investir em projetos de leitura voltados para a comunidade. Ele ganhou. Tentei encontrar o vídeo no YouTube, mas não consegui. Por outro lado, encontrei esse vídeo em que ele resume a história dele:



Também encontrei o blog com o projeto do Otávio, Ler é 10, Leia favela, mas infelizmente ele não é atualizado desde 2013. 

Esse livro foi bacana de ler por dois motivos:

Primeiro, é possível ter uma leve noção da dinâmica de uma favela. Claro que o Otávio não entra em detalhes, mas conta que as crianças que moram nas favelas dos morros, em geral, não saem dali, não conhecem nem a praia, pois tudo é perto (a igreja, o mercado, a escola), o que limita um pouco o olhar e as perspectivas delas. O acesso à cultura também fica limitado, já que bibliotecas, cinemas, teatros não ficam tão perto. A leitura seria um meio de alargar a visão delas, mostrando que, apesar de a vida muitas vezes ser difícil ali (falta de recursos de todos os tipos e sobram violência, tiroteios, tráfico de drogas), existem outras possibilidades. Outro fato óbvio, mas que eu não sabia, é que os traficantes dão "assistência social" para os moradores - por exemplo, compram um botijão de gás e outras coisas de que as famílias precisam -, mas exigem respeito e lealdade; por isso, em caso de delação, as pessoas são juradas de morte e são torturadas antes de ser executadas para servirem de exemplo. Isso me faz pensar que o governo poderia ter agido e não agiu na hora certa; deveria cuidar dessa população, mas quem supostamente dá assistência, na verdade, são os bandidos - como vão reverter isso? UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora) bastam?

Segundo, porque quando penso em trabalho voluntário, uma das duas coisas que eu gostaria de fazer e faria com prazer seria isso que o Otávio faz tão bem: divulgar livros e leitura para crianças. Acredito que as crianças podem crescer com mais consciência de que têm escolhas (em maior ou menor grau, mas têm escolhas; entrar para o tráfico de drogas, por exemplo, é uma escolha) e que podem decidir o que é melhor para si próprias no futuro. Outro trabalho que imagino que seja muito gratificante é alfabetizar jovens e adultos - faria isso como voluntária com muito prazer. Já participei de alguns trabalhos voluntários, mas nunca senti que realmente estivesse fazendo alguma diferença. Esses dois tipos de trabalhos me dariam satisfação porque, mais dia, menos dia, o impacto positivo (da leitura e da alfabetização) na vida das pessoas ia começar a aparecer. E fora o óbvio: a minha crença de que todos deveriam ter o direito de saber ler, escrever e de decidir o que é melhor para si.

Minha admiração, Otávio Júnior!

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